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sexta-feira, 1 de maio de 2009

Jogo da Verdade - Parte V

Ao abrir a porta, uma criança pulou em seu colo.
- Tiaaaaaa! Você ainda tá aqui!
- Claro que sim, meu amor!
- Bom dia, Tina!
O rosto dela contraiu. Como ele tinha coragem de chamá-la assim? Nunca havia lhe dado intimidade para isso. Cínico!
- Bom dia, Benedito.
Virou as costas, com o sobrinho no colo, deixando o rapaz rindo na entrada do apartamento. Foi prá cozinha como se intimando a irmã.

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O visitante fechou a porta, sentou-se no sofá e ligou a TV. Agia como se nunca tivesse decidido que não iria mais viver ali. Marília, ao chegar na sala e ver a cena, respirou fundo prá não reclamar. Não queria brigar no dia do aniversário de Edgar.
Então, sentiu o cheiro. Aquele perfume “Minotauro”. Resista!
-Pensei que iria trazê-lo só no fim da tarde.
Sem tirar os olhos da TV, onde passava um desenho animado, respondeu.
- Algum problema nisso?
- Você não passou nem três horas com o menino.
- E vou passar mais! Só que aqui.
- Aqui?
- É, sim! – Tirou os olhos da TV e a encarou - Na casa que minha família comprou prá nosso filho crescer. .
- E que você abandonou dizendo que era prá nosso filho.
- E eu falei o contrário?

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Andou de um extremo a outro da sala, tentando se acalmar prá evitar uma discussão.
- Hoje é aniversário dele, Tito! Porque você não passa o dia com ele passeando?
- Porque eu e ele queremos passar aqui, com você que é a mãe dele.
- Só que... só que... – respirou fundo. - Eu e Martina estávamos preparando a festinha surpresa prá ele. Prá quando ele chegasse, encontrasse tudo pronto!
- Ele sabia que haveria a festa. Ele quem me contou. Pronto, vamos ajudar!
- Você quer ajudar? Quer mesmo? Pague a pensão em dia. Só essa ajuda que eu quero de você.
- Lá vem você com sete pedras na mão! Você bem sabe que eu não pago no dia, mas eu pago. Eu vivo de comissão, baby, esqueceu?

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Marília tentou voltar prá cozinha quando viu Tito levantando-se e andando em sua direção. O perfume... Todo lindo! Resista! Mas ele foi mais rápido e a abraçou pelas costas.
- Má... Você é má comigo! A gente não podia ainda estar vivendo aqui juntinho, como uma família? Ai, qualquer trocadinho...
- Me solta, Tito!
- que eu ganhasse ia chegar a sua mão – sussurrando no ouvindo – todo dia!
- Me larga!
- Não. Você não quer isso, não. Eu sinto isso! – e a apertou mais forte contra o corpo.
- Tito, me larga que eu preciso terminar os salgados da festa!

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Ao consegui soltar-se, consertou a blusa e encarou seu ex-marido.
- Muito bem! Você quer ajudar! Então fique olhando o menino enquanto eu e Martina terminamos, que cozinha não é lugar de criança.
- Tem alguma gelada aqui?
- Nem gelada, nem quente.
- E você vai servir o que na festa?
- Refrigerante. Aniversário de criança se serve refrigerante.

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Foi à cozinha e voltou com o filho nos braços. Ao colocar a criança no colo do pai, perguntou:
- Por falar nisso, como foi que você entrou no prédio, hein?
- Usando minha chave do portão.
-Ah! Usando sua chave! Óbvio!
Ao caminho da cozinha, Marília teve uma idéia e retornou.
-Você poderia me emprestar essa chave?
- Prá quê? – perguntou Tito intrigado.
- Hum... Martina precisa descer prá comprar um ingrediente e o interfone está quebrado.
- E a sua chave?
- Vamos lá, Tito! – estendendo a mão.
Dando uma risadinha, Tito retirou a chave do chaveiro.
- Obrigada!

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Na cozinha, contou seu plano aos cochichos para a irmã.
- Desça e finja que vai comprar alguma coisa. Aproveite e compre mesmo, que vai dar na vista se ele te ver sem nada, na volta. Compre... leite moça e nescau. Na volta, não devolva a chave prá ele. Eu vou ficar prá mim.
- E ele não vai sentir falta da chave, Mari? Pense! Se ele até hoje anda com ela. É capaz de ter até daqui da porta.
- É mesmo! Mas eu penso isso depois. O importante é “esquecermos” de devolver a chave prá o Tito. Agora, vá! Mas não demore que ainda tem muita coisa prá fazer.



.....
Capítulo especialmente dedicado ao Ronca Ronca e as fofuxas e fofuxos que conheci através do programa!

sábado, 27 de dezembro de 2008

Jogo da Verdade - Parte IV

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Não havia mais vestígios da chuva do dia anterior. A rua estava seca, o tempo estava quente e o sol radiante. Só o cabelo de Martina estava “tempestuoso”.
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Como iria passar parte do dia com a mão na massa, literalmente, resolveu fazer um nero no cabelo. Como Marília não tinha grampos suficientes e nem ela havia trazido os seus, fez um rabo de cavalo e saiu prá comprar.
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Não foi difícil encontrar uma loja de produtos prá cabelo. Há várias com todo tipo de shampoo, creme e máscara prá cabelo rebeldes, com frizz, estressados, desidratados, tinturados, alisados, fracos, quebradiços e todos outros tipos de problema e característica que um cabelo crespo pode ter. Não se esqueça que essa história ocorreu em Salvador. Aproveitou e comprou um creme com “coquetel de vitaminas”. Bem, pelo menos era um creme colorido: rosa, verde, amarelo e branco, em camadas no pote transparente.
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No apartamento 203, Ramon queria trocar seu (inexistente) reino por um par de meias “usáveis”. Nem precisava estarem limpas, na verdade. Bastava parecerem que haviam sido lavadas. Mas também, se não achasse, ia no cesto de roupa suja e pegava qualquer uma! Ou ia sem meia!
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Ao chegar ao portão do prédio, Martina lembrou que o interfone ainda estava quebrado e havia, prá variar, se esquecido de levar o celular. “Burra!”
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Se tivessem combinado, não teria dado certo:
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- Tá perdida de novo?
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A imagem daquele rapaz lhe veio dessa vez com um perfume gostoso. Conhecia aquele cheiro de algum lugar. Que perfume era aquele mesmo? Tava uma graça com os cabelos molhados num topetinho arrepiado. Camisa pólo, bermuda cargo. Só achou estranho o tênis sem meia.
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- Não!
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-Ah! É porque seu lugar é ai fora do portão, né?
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“Que menino mais idiota!”
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Antes ele tivesse jogado logo um balde de água fria. O meio sorriso virou bico que Ramon percebeu. Até com raiva a menina fica uma graça. Pena que hoje estava com o vestido mais comprido que no dia anterior. Sentiu vontade de desamarrar aquele bico com um beijo
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- Desculpe a brincadeira, moça! – abrindo o portão e deixando-a entrar antes de sair. -Ce tá indo em que apartamento?
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- 303.
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- Ah, beleza! Depois então a gente se fala. Valeu! - E saiu correndo.
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Ainda estava com raiva. Era a segunda vez que tirava onda com a cara dela. Será que é porque ele viu que ela tava olhando ele no açougue? Tinha que aprender ser mais discreta, caramba! O cara só devia achar que ela tava afim. Que idéia!
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E o que ele quis dizer com “depois”? Seria um “depois” hipotético ou real? Será que ele estaria no aniversário? Não era possível! Devia ter coisas mais interessantes para fazer num sábado a noite. Ele tava tão gatinho! Com aquela cara... vixe... Que nada! Além do mais, era capaz de só voltar no dia seguinte, de nunca mais vê-lo.
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- Sabe aquele cara que te falei ontem que abriu o portão prá mim?
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- Hum... O que tem?
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- Ele quem abriu de novo o portão prá mim.
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- Por que você não levou a chave?
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- Ia te deixar sem chave?
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- Mas você não foi rapidinho?
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- É.
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Marília tirou os olhos da massa do pastel prá olhar a irmã. Martina devia tá querendo lhe falar mais alguma coisa. Mas o que? O menino abriu o portão de novo. Pronto! Da próxima vez ela leva a chave. Mas, ora! Devia ser só isso.
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Martina era muito compenetrada, direita. Não iria sofrer os tropeços que sofreu. Além disso, tava muito nova: 16 anos. Tinha mais é que estudar, pensar no futuro, ser independente. Sabia que a irmã tinha medo que lhe acontecesse o mesmo. Percebeu o olhar assustado no dia anterior. Talvez, por causa disso, até tivesse um pouco de medo de homens. Nunca havia falado de namoros e meninos, mesmo quando provocada. Era melhor assim!
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Melhor cuidar dos pastéis, viu! Ao pegar a tigela com frango desfiado, sua cabeça foi invadida por ecos do passado, que considerava esquecidos. Quis lutar, mas a lembrança, inexplicavelmente, foi mais forte.
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- É esse?
- Hum... não!
- É esse?
- Não.
- E esse?
“Será que Chele apertou mesmo meu olho?”
- Fala logo! É esse?
“Ai, Meu Deus? E agora?”
- É...
- É?
“Agora sim ela apertou! Mas... o que será que Chele quer que eu faça? Será que é prá eu confirmar ou dizer que não?”
- É.
-Pêra, uva, maçã ou salada mista?
“Um aperto na hora de salada mista. Será?”
- Hum?
- Nossa! Hoje a Mari tá toda lesa! Acorda! Pêra, uva, maçã ou salada mista?
“Outro aperto no salada mista. Mas... e se Chele tiver me sacaneando?”
- Saaaaalada mista.
Risadas e gritaria. “Ain... porque eu fui dizer salada mista?”
Mesmo depois de Chele tirar as mãos dos olhos, ela ainda estava de olhos fechados. Que medo de abrir e não ser o Tito! Que medo de ser o Tito! Ouviu risadas e percebeu que tava fazendo papel de boba. Abriu os olhos e não pôde conter o sorriso de vergonha e felicidade. Com certeza todos ao redor ouviam as batidas de seu coração.
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- Não é melhor fazer logo os brigadeiros?
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- ...
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- Marília!
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- Ãhn?
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- Tava dormindo? Os brigadeiros. É melhor fazer logo prá esfriar até a hora da festa.
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- Ah, faça!
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Melhor cuidar dos pastéis e deixar o passado no seu lugar: no passado.
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Martina havia parado de fazer conjecturas sobre o tal rapaz do 2º andar. Mas que ele tava bem cheiroso, tava! Mas era grosso! Tirou onda com a cara dela! Mas agora não pensava nisso.
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Depois de enrolar, ficou admirando e sentindo o cheiro dos brigadeiros recém-feitos. Lembrou-se das festinhas que ia, quando criança. Música, bexigas e brigadeiros, o trio perfeito. Enquanto a mesa de doces não era liberada, brincava, mas com o olho comprido prá cima dos brigadeiros. Que alegria comê-los! Sentir aquele sabor de chocolate, o doce derretendo na boca e o granulado descendo coçando a garganta.
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A buzina tocou, despertando as irmãs do passado e trazendo-as de novo ao presente.
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- Má, atenda prá mim, por favor. Deve ser os quibes da Dona Gal.
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E quibes andam sozinhos? Quis perguntar, mas levantou-se, limpou as mãos no pano que estav no seu ombro e se dirigiu a porta.
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Quando olhou pelo olho-mágico, tomou um susto. Ao som de outra buzinada, retirou as pressas os grampos do cabelo, jogando-os no chão, e tentou pentear com as mãos.
Respirou fundo e abriu a porta.
.
(Continua)

domingo, 7 de dezembro de 2008

Jogo da Verdade - Parte III


Passos apressados e rosto ainda queimando. Não sabia se era vergonha, raiva ou uma mistura dos dois. “Esquece, Martina. Até a noite de hoje eu já vou ter esquecido.”
Sentiu de novo uns pingos, mas já estava na frente do prédio onde mora a irmã.
Aquele era um pequeno conjunto habitacional com prédios de três andares, sem guarita. O medo fez com que todos fossem os blocos fossem gradeados, com interfones prá solicitar o acesso.

303. Quando Martina apertou o botão referente ao apartamento da irmã, não ouviu o barulhinho característico. Mas, nem ligou e esperou. Cerca de um minuto depois, apertou de novo. E mais uma vez após mais um minuto. Olhou prá cima, pras janelas, mesmo sabendo que o apartamento da irmã é voltado pros fundos. Mas queria alguma ajuda. “Ai, meu Deus! Cadê a Marília?” E os pingos ainda caindo do céu. Tentava ao máximo se proteger, enquanto mais uma vez apertava o botão para o apartamento da irmã.

Estava procurando o celular na bolsa quando sentiu alguém se aproximando. Assustada, apertou a bolsa no corpo com os braços e arregalou os olhos.

- Calma, que eu não vou te assaltar. – disse rindo.

O coração quase saiu pela boca. Era o rapaz do açougue.

- Não, não...

“Essa mina ta uma graça de rosto vermelho. Mas é muita sorte essa minha, mesmo.”

- Tá perdida?

- Não... – porque nunca conseguia ordenar os pensamentos quando ficava nervosa?
Porque ela tava nervosa, mesmo?

- Ah! Então você já se achou! – rindo, destrancou o portão e entrou no prédio.

“Esse menino tá tirando onda com minha cara? Ele tá rindo de mim. Nem vou perguntar nada prá esse idiota. Ai! Será que vai chover de novo? Eu queria pelo menos entrar no prédio.”

“Chamo ela prá se proteger da chuva aqui no prédio? E se ela levar a mal meu oferecimento?”

“Vou só chamar Marília uma vez pelo interfone. Se não atender, eu ligo e vou embora. Era prá ela estar em casa!”

- Moça, nem tente que o interfone tá quebrado.

- Quebrado? – com o braço ainda esticado no ar.

- É! Faz já uns dois dias. Porque você não entra e vai diretamente ao apartamento que você quer?

“Pensei que nunca iria oferecer.”

- Ah, tá! Obrigada!

Mal esperou ela entrar, Ramon subiu correndo as escadas. Lembrou que a cozinha ainda estava um caos e a mãe chegaria em poucos minutos. Não desejava naquela semana arranjar confusão em casa.

Enquanto subia as escadas, Martina ouvia o barulho e o eco das passadas de Ramon acima de sua cabeça. Estava a alguns degraus do segundo andar quando viu a porta do 203, logo abaixo da casa da irmã, se fechar ruidosamente.

“Nossa, ele mora aqui! Que coincidência. Marília deve conhecer.”

- Menina, que demora foi essa? Você tá linda! Entrou como no prédio? – falava Marília entre abraços e beijos no rosto da irmã caçula.

- Eu tava lá embaixo apertando o interfone feito uma doida. Ai, apareceu um rapaz e abriu o portão.

-Um rapaz? Que rapaz?

- Ah, um moreninho... Ele entrou no apartamento aqui embaixo.

“Deve ser o Ramon ou o Pablo. Não! A essa hora em casa, é o Ramon.”

- Que chuva, hein? Nem trouxe sombrinha.

- Mas você vê que tá fazendo sol. E nem abafou o calor. Semana passada...
Martina nem prestou mais atenção no que Marília falava, ao olhar prá irmã e constatar o quanto estava acabada. Devia ter o que? 27 anos? Parecia ter uns 10 anos a mais.”

-... de você! – e olhou a irmã.

Vendo Marília lhe encarando, saiu do transe.

- Ãhn?

- Fale de você!

-Ah, eu to bem! Estudando, vendendo minha Avon... Cadê Edgar?

- Daqui a pouco ele chega. Ai, você vai ver o amor de sua vida.

- O que é isso Marília? Ciúmes?

- Que nada! Já estou conformada com esse amor roxo de vocês dois! Olha, ele ainda não sabe da surpresa, não! Então, boca piu!

- Pode deixar!

- É tão bom te ver!

- Eu também acho! Eu também acho!- falou abraçando bem forte a irmã.

(continua...)

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Jogo da Verdade - Parte II

Parte I está logo abaixo deste post.
Pisando aqui e acolá. É assim que se anda pelas ruas de Salvador quando se está chovendo: desviando das poças de água e da água jogava prá calçada pelos carros. E quando se tratava de chuva e poça de água, o Cabula é generoso.

Para a água que vem do céu, guarda-chuva, ou sombrinha de corações coloridos como era o caso. E prá a água que vem de baixo e dos lados? Nem adianta calça ou tênis, pois é pedir prá ficar com a roupa ou o sapato molhado, o que é ótimo prá pegar uma gripe daqueles que te derrubam uma semana! Além disso, não estava frio, muito pelo contrário! Aquela chuva até que era bem vinda prá acabar com o mormaço que amolece até as mais resistentes das criaturas.

Pisando aqui e acolá, aqui e acolá, aqui e acolá. Tentando molhar o mínimo possível dos pés na havaiana branca. “Por que eu não vim com outro chinelo? Dá mó trabalho de lavar essa, ô cabeça!”

Entrou, ainda de sombrinha aberta sobre a cabeça, no açougue. Quase acertou a testa de uma garota que estava no meio da entrada.

-Oh, desculpa aê!

Mas queria ter dito: “Isso lá é lugar de ficar? Saia do meio do caminho, mulher!” As pessoas se ocupam dos espaços como se fossem os donos. E você que tem que desviar das majestades, caso contrário tem briga.

Martina quis xingar, afinal respingou umas gotas da chuva em seu cabelo. Quis mandar o cara olhar por onde andava. Podia ter acertado o olho dela! E aí? Ia pagar o tratamento? Mas ela não estava em seu bairro. As coisas andam num rumo que quando pisam no seu pé, você ainda tem que pedir perdão. Educação virou um caso de sobrevivência!

- Foi nada, não. – tentou falar no tom mais simpático possível.

Ramon nem a ouviu. Seguiu prá o balcão, já gritando pela Dona Zuza.

-O que é isso, menino? Ainda não to surda, não!

- Oh, tia. Me vê aê meio quilo de carne moída.

-De qual carne, menino?

- Ah, sei lá!

Como uma pessoa vai comprar uma coisa que não sabe? Martina virou-se prá dentro do açougue olhando prá o rapaz, que estava de costas prá ela, não acreditando.

- Minha mãe vai fazer quibe, tia. Então, é carne moída prá fazer quibe.

-Então, aprenda, menino: é patinho. Meio quilo, né? Espera que vou moer.

Enquanto esperava pela carne, Ramon assoviava a música que estava ouvindo a pouco em casa. Olhava a vitrine de carnes, mas pelo vidro percebeu que aquela garota que ele quase acertou com a sombrinha estava olhando prá ele. Certamente estava esperando a chuva passar. “Gostosinha! Cabelos lisos, meio bagunçados. Deve ser natural, já que não está reto feito uma parede, como fica o cabelo de minha mãe quando ela alisa.”

“Que menino mais doido! Olha a sombrinha de corações! Deve ter pegado a primeira que viu pela frente, sem se preocupar com o que os outros iam pensar. E nem sabia que carne era prá comprar. Agora, ta olhando as carnes como se fosse roupa. Menino sem-noção! Esse aí deve viver a vida sem que se preocupem com o que pensem dele.” Enquanto pensava, sorria.

Então, viu que o rapaz também sorria prá ela pelo vidro da vitrine das carnes. Virou-se prá a entrada do açougue bruscamente, de vergonha. “Ele viu que eu tava olhando prá ele.” Só então reparou que a chuva havia passado. Saiu quase que correndo.

Ramon se deliciou quando ao virar o vestido da garota deu uma leve levantada, revelando a lateral e a parte de trás da coxa esquerda. Inconscientemente virou-se na direção dela, pôde perceber pelo desenho da calcinha no vestido, que era pequena. “Safada! Pena que saiu correndo!”

(continua...)

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Jogo da verdade - Parte I

Essa é uma história que me contaram, daquelas que aconteceram com a sobrinha da vizinha da secretária do avô da namorada do irmão mais velho da melhor amiga da dona do salão onde faço minha unha.

Numa tarde tão ensolarada começou repentinamente a chuviscar. Faltava menos de cem metros prá chegar ao seu destino. Porém, a moça, coitada, tinha feito escova no cabelo naquela manhã. Tanto tempo esperando, lavando o cabelo naquela cadeira tão desconfortável prá o pescoço, tendo o cabelo puxado repetidas vezes com tanta força que só faltavam arrancar o couro cabeludo, as orelhas queimadas pelo calor do secador e o dinheiro gasto, não podiam ser desperdiçados assim, à toa! Martina, esse é o seu nome, olhou em volta.

-Ai, meu Deus! – com as mãos, de dedos esticados, à cabeça tentando, em vão, proteger o cabelo daquela água.

Entrou na primeira porta comercial que viu aberta. Era um açougue. O cheiro concentrado de carne somado às moscas e ao calor embrulhou o estômago daquela jovem. Será que não era melhor enfrentar o chuvisco? Afinal, tava tão fraquinho e a casa da irmã estava tão perto! “Nããããão! A escova!”

O chuvisco ficou mais forte, dando pistas que realmente iria chover. Mas nada muito preocupante, já que essas chuvas de verão vão embora como vêm: repentinamente. Por isso não cogitou ligar prá casa de sua irmã. Por que ela nunca carregava sombrinha?

Enquanto isso, Ramon procurava o guarda-chuva. Estava chovendo, mas ele não tinha muita escolha, ao não ser sair assim mesmo! Desde manhã que a mãe havia lhe pedido que comprasse carne moída. Mas foi fazendo uma coisa, foi fazendo outra... E protelando a hora de ir. Pois faltavam menos de uma hora para que sua mãe retornasse do trabalho e era melhor ele sair logo prá comprar as carnes. Caso contrário, ouviria durante uns bons quatro dias o quanto ele era preguiçoso e não colaborava com as tarefas em casa. “Antes enfrentar a chuva!”

Nada do guarda-chuva! Mas como, se ontem mesmo ele havia visto pendurado no antiquado porta-chapéus, na sala?

Acabou encontrando no quarto da mãe uma sombrinha lilás com corações coloridos. Que vergonha! Sair com essa sombrinha tão feminina? Mas, havia escolha? Era isso ou nada! Isso ou a chuva! Como se sombrinha ou guarda-chuva algum pudesse mantê-lo completamente seco.

-Ah, véi! Tomara que ninguém me veja!