Eu já nem lembrava mais dessa história, quando Leleía me ligou toda esbaforida. Ela tinha se encontrado com o gatinho no Shopping Piedade e ele a levou para ver umas paradas de filmes lá dos lados do Japão na Biblioteca Central. O cara ficou todo entretido nas paradas do filme, nem parecia que ela tava ali, toda gatinha, do lado. Ela viajando que ia assistir um filminho no Center Lapa prá dar uns pega no gato e acabou vendo foi umas coisa de samurai. Até cogitou estar de bafo ou cecê.
No fim, em cima de um lanche vegetariano, ele falou que era de uma religião oriental aê e que só podia se relacionar quem também fosse. E prá isso era fácil: Era só ir ao templo na Boca do Rio, dar um dinheirinho, ouvir e se ajoelhar. Leleia avaliou o bofe e achou que valia a pena, já que ela não é apegada a religião, não. Mas como não era besta nem nada, sozinha é que não ia. E me convocou prá empreitada.
E foi assim que tive que acordar cedo em pleno sábado. O que não faço por essas amigas que arranjei, hein? Que viagem! Além da demora do buzú, o raio ainda dá volta prá zorra. Valha-me! Seguindo o endereço, paramos numa casa de 2 andares. Nem parecia igreja.
Uma japinha bem simpática nos atendeu. Pelo que entendi, ela era tipo a pastora do lugar. Ainda bem que o Joedson estava lá, mas isso porque ele mora do lado. Ainda é fácil, né? Queria ver ser de uma religião do outro lado da cidade. Fora a gente, tinha mais umas 7 pessoas.
Naquela época, quando não tinha conhecimento dessas coisas, até achei que aquela igreja era pobre porque não tinha bancos para sentar. As pessoas rezam e se ajoelham nuns tapetinhos acolchoados em frente à uns quadros e estandartes.
Depois de uma conversinha, a japinha foi bem insistente em cobrar o dízimo. É! Por que nessa religião, você nem bem entendeu nada, mas já entra com o “dízimo”. Como o valor tava em aberto, dei uma nota de R$1,00 que naquela época ainda existia. Foi mesmo! Eu tava lá era de acompanhante, ou melhor, de vela. Até acho que Leleia é que devia pagar a minha. O pior que ela me olhou mais feio que a japinha, vê se pode? Como queria fazer bonito pro gatinho, deu R$10,00. A japinha anotou nossos nomes e o valor da contribuição.
Nisso começou a cerimônia toda. Olha, eu me lembro de meus joelhos terem doido de tanto tempo que durou eu ajoelhada. Era num idioma que entendi nada. Só sei que na hora mesmo do batismo, ficamos só eu, Leleia e mais duas mulheres. Foi um tal de se abaixar que não tinha mais fim. Eu já tava achando aquilo tudo uma piada, não vou mentir. Como é que aquilo ia entrar no meu espírito naquela língua que só era “nagui-nigui-nigui-nagua” e eu naaada de entender!
Teve uma hora que a mulher resolveu falar português: na hora de falar os nossos nomes, apontando quem era e quanto nós contribuímos. Olhe, eu lembro até hoje: uma deu R$20,00, outra R$50,00, Leleia R$10,00 e eu R$1,00. Quase que eu aproveito que tava ajoelhada mesmo e comecei a cavar um buraco para me esconder. Ô vergonha! Ô raiva!
Eu só queria sair dali, nem quis comer o que ofereceram e fui para casa bufando. Vê se isso é coisa de Deus?!
O pior é que o lance entre Leleia e Joedson nem vingou. Quando finalmente ela conseguiu beijar o cara, saiu toda babada de cuspe do desinfeliz. Não era a toa que bonito como era, tava solteiro. Também, esses beatos não pode saber beijar mesmo, quanto mais o resto, né?
Só sei que acabei interessada nesses lances do oriente, mas dessa vez em religiões mais conhecidas e que não pediam logo o dindim.
(Continua.)